quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

SERAPIÃO ALVES DE ANDRADE



SERAPIÃO ALVES DE ANDRADE

Serapião Alves de Andrade, apelidado pela família de Sinhorzinho, forma como era mais conhecido, nasceu em Queimadas em 30 de outubro de 1927. Na ocasião, seu pai, Pedro Andrade, farmacêutico, encontrava-se em Quiginque para onde constantemente viajava a trabalho. Naquele tempo o meio de locomoção mais acessível era o animal, o que fazia de curtas distâncias uma longa e demorada viagem, motivo pelo qual quando retornou a Queimadas Dona Ana Carolina Andrade, apelidada de dona Rola, já havia há alguns dias, dado à luz ao menino batizado Serapião a pedido do pai em razão de uma visão que tivera onde três moças saindo de um buraco que falavam seqüencialmente este nome.

Segundo dona Terezinha, viúva do mesmo, ele dizia com graça: “meu nome é Serapião e meu apelido Sinhorzinho que já está dizendo bem o que fui no passado. Em alguma das reencarnações devo ter sido algum senhor de engenho ou de escravos”.

Ainda menino revelava à mãe de maneira insistente o desejo de deixar sua terra natal em busca de novos horizontes. Promessa que cumpriu com menos de dezoito anos, quando deixando um bilhete à família, juntamente com um amigo, fugiu de carona em um caminhão de carga rumo à Itabuna, Sul da Bahia, onde permaneceu por menos de um ano até decidir partir de novo em direção ao Rio de Janeiro convencendo o amigo a segui-lo.

Mais uma vez utilizando-se de carona, chegaram ao Rio onde hospedaram-se numa pensão. Serapião, agora com 18 anos, alistou-se no exército alcançando a patente de cabo quando resolveu se desvincular. À procura de trabalho, folheou os classificados de um jornal encontrando um anúncio que falava da disposição de uma vaga para rapaz experiente em farmácia. Enquadrando-se nas exigências, já que trabalhava ajudando seu pai farmacêutico antes de ali chegar, conseguiu o emprego.

A farmácia onde passou a trabalhar ficava localizada em Caxias. Após três anos na capital fluminense, certo dia chegou ao balcão em busca de um medicamento, uma jovem moradora da Praça da Bandeira que estava no bairro em visita aos avós. Foi amor a primeira vista. A moça desmanchou o compromisso firmado com outro rapaz e no período de efêmeros seis meses namoraram, noivaram e casaram no ano de 1955. Ele aos 23 anos, ela com 18. “Nosso encontro tinha que acontecer. Era previsto na espiritualidade”, declara dona Terezinha Andrade.

Serapião Andrade e Terezinha de Jesus de Andrade foram morar no bairro de Botafogo. Viveram mais cinco anos no Rio onde nasceram as duas primeiras filhas, Ana Cristina e Ana Margareth, contando estas, respectivamente, 3 e 2 anos quando seu pai, “Será”, como era e ainda é chamado de maneira carinhosa pela esposa, resolveu retornar à Queimadas atendendo ao pedido expresso nas cartas enviadas por Seu Pedro, que dizia precisar de ajuda com a farmácia de sua propriedade que ficava na Avenida 13 de Junho, em frente à Praça Rio Branco, onde hoje encontra-se uma pastelaria.

Em 1960 a família chegou ao município. Indo morar primeiramente na casa dos pais dele até que a casa, onde moraria definitivamente, localizada na Rua São José, que estava alugada, fosse desocupada. Período este que coincidiu com a candidatura de seu irmão, Analdino Andrade, à prefeitura.

Queimadas naquele tempo era uma cidade provinciana, onde a luz, fornecida por um gerador desligava às dez horas, sem as novidades e o movimento característico dos centros urbanos nas grandes cidades. Localidade onde o progresso demorava a chegar e possuidora de clima e hábitos bem diversos aos que estava acostumada a jovem carioca, o que a impactou negativamente.

Terezinha, em evidente estado depressivo, começou a apresentar alterações no seu comportamento, inclusive episódios de alucinação. Sinhorzinho, não encontrando explicações para a aflição da esposa e por isso bastante preocupado, passou a freqüentar as reuniões do centro espírita atendendo ao conselho e convite do amigo Dr. Élzio, então presidente da casa.

Os dois, juntos, viajavam para o centro espírita de Serrinha onde Dona Terezinha começou um tratamento. Através de passes e leituras da doutrina espírita ficou curada. A mesma acredita que os problemas que apresentava não eram de ordem médica, mas espiritual, pois os sintomas que a tinham levado a procurar ajuda cessaram.

Estes momentos de bastante sofrimento modificaram para sempre a visão de mundo e de Deus que até então o casal possuía. Apartir daí tornaram-se freqüentadores assíduos do Centro Espírita Filhos do Calvário, mais especificamente Sinhorzinho que incluiu na sua rotina a dedicação ao estudo das lições de Alan Kardec, fundador da doutrina e a realização dos trabalhos de evangelização e caridade junto à comunidade, finalidade que a constitui. “Se eu não tivesse abraçado esta doutrina acho que seria ateu” dizia ele. Quando habitava no Rio de Janeiro presenciou muita desigualdade sócio-econômica. Pelas ruas via pessoas se alimentando dos restos contidos nos latões de lixo em contraste gritante com a vida dos cachorros de madame das residências abastadas de Copacabana onde era chamado para aplicar injeções. Pessoas comendo lixo e cães filet mignon o fazia, por vezes, duvidar da existência de Deus. “Será que existe Deus? Porque não é possível que tenha seres humanos nestas condições”. Em meio aos estudos da doutrina encontrou no livro dos espíritos a lição “A desigualdade das riquezas” que respondeu aos seus questionamentos em relação à existência de pobres e ricos e o fez compreender a grandeza divina e sua bondade. Entendeu que a reencarnação, princípio fundamental da doutrina, é a oportunidade de remição dada pelo Altíssimo ao Ser Humano. Representa a justiça divina. “Deus não condena nenhum de seus filhos”.

Além das duas filhas nascidas no Rio de Janeiro, tornou-se pai ainda de Ane Evelin, Raniere Cézar (homenagem ao bisavô materno), Ângela Cristiane, Rivail César, Alcione Célia e Nadja Andrade; além de registrar e criar como filha legítima Iziane Mabel Andrade.

Após o mandato de Analdino à frente da administração do município, em meados de 1983, Serapião abriu a própria farmácia na Travessa J.J. Seabra, onde atualmente funciona a Farmácia Carneiro.

Anos após intenso estudo e adquirida experiência à frente da doutrinária e da sessão mediúnica, chegou à presidência do Centro Espírita. Responsabilizando-se por coordenar as atividades propostas como a distribuição da sopa, as aulas ministradas às gestantes e a doação de enxovais ás mesmas; além de promover a arrecadação de fundos, dinheiro doado com o qual realizou benfeitorias na unidade, entre elas a ampliação desta com a construção de quatro salas ao fundo destinadas à evangelização de jovens e crianças, desobstruindo assim o salão único que até então era destinado a todos os trabalhos.

Construiu no bairro da Ponte Nova, em um terreno próprio onde fica a cerâmica, o núcleo espírita que nomeou de Rosinha em referência à parte interna do Filhos do Calvário, chamada por Dr. Élzio de Lar Rosa do Infinito. O terreno foi posteriormente vendido à Heide Cayres que a pedido de Sinhorzinho manteve a pequena casa. Há pouco, foi aberto um bar junto ao Rosinha. Percebendo a impossibilidade da manutenção do centro no local, em virtude do barulho ali produzido, a turma mais jovens que o compõe – entre eles, os professores Ricardo, Esteves e Nel – uniram-se possibilitando a compra de outro terreno no mesmo bairro e a construção de uma casa para a qual foi transferida o centro espírita daquela localidade. Todos os sábados há uma reunião de evangelização, sendo ao seu término distribuídos aos participantes os farnéis compostos por produtos de primeira necessidade.

Sinhorzinho não era médium de incorporação. Era sensitivo. Captava instruções dos espíritos. A esposa declara que quando era solicitado a receitar, ficava parado, calado, esperando que os mentores espirituais viessem sugeri-lo o remédio que aplacasse o mal do paciente. “’Será’ sempre dava bons conselhos, mas notávamos que estes não partiam dele”.

Serapião lidava com a morte de forma tranqüila, era para ele um fenômeno normal, como nascer. Dizia: “A morte é um fenômeno natural. É o mesmo que trocar de roupa, pois a morte se dá meramente no plano físico, o espírito é eterno”.

Com esta calma conferida pela espiritualidade foi que encarou a tragédia que abateu a família com a morte por eletrocutamento de uma de suas vinte netas. “Você tem que se conformar. Você é espírita e sabe o que significa a morte. A morte é apenas uma passagem, todos nós vamos nos reencontrar”.

Não tinha medo de morrer. “Se eu viver 75 anos estou bem”. E foi justamente aos 75 anos, em 26 de dezembro de 2002, que desencarnou. Data que coincidentemente refere-se também ao dia em que pediu a jovem Terezinha em noivado. Sinhorzinho vinha sentindo fortes dores nos membros e articulações, ficando por dois meses acamado. Com o agravamento da saúde foi levado pelos familiares ao Hospital Edson Silva onde em questão de poucas horas veio a falecer.

Dona Terezinha Andrade acredita que o marido tinha certeza da proximidade da sua partida rumo ao mundo espiritual, pois depois do acontecido foi encontrada entre os seus pertences uma carta onde dava as últimas providências ao momento. Não queria que sua morte fosse anunciada em carro de som, pediu músicas evangélicas no velório e recomendou que não houvesse choro.

“‘Será’ viveu para o Centro, para a doutrina espírita. Sua vida se resumiu nisto. Era reservado, calmo, calado, família, bom marido, bom pai. Bom tudo. Era de fácil convivência, não julgava, nem tinha palavras para ofender nem criticar ninguém, perdoava facilmente. Eu acho que ele foi uma pessoa iluminada”, declarou a esposa saudosa.

Fonte: http://www.queimadasfm.com.br/qfm/2011/06/06/serapiao-alves-de-andrade/

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