quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

JOEL AMÂNCIO DE SOUZA



Joel Amâncio de Souza

Nascido em Queimadas no ano de 1920. Filho de Manuel Amâncio de Souza e Jardilina Ferreira de Souza, sendo o segundo de seis irmãos: Celina, Celsina (falecida), Clemilda (falecida), João e Célia Amâncio de Souza.
Estando sua mãe grávida de sete meses, ouviu por três dias o choro do bebê ainda no ventre. No quarto dia, inesperadamente, deu á luz ao frágil garotinho que de tão pequeno precisava ser enrolado em algodão, já que nenhuma roupa cabia. O parto se deu com a ajuda de uma parteira na casa da família, construção na Av. Nonato Marques.
O menino batizado Joel com menos de uma semana foi dado como morto por não apresentar sinais vitais. Colocado em uma caixa de charutos estava sendo levado á capelinha de São José, onde eram enterradas as crianças, quando suspirou, ao que disseram: “Volta que o menino está vivo”, conta o próprio sorrindo.
Teve uma infância marcada pelos banhos de rios junto aos primos e pelos ataques de Lampião e seu bando à cidade.
Passado o tempo, aos 21 anos, Joel mudou-se para casa de parentes na capital baiana em busca de trabalho. Após uma semana de estadia na cidade empregou-se na empresa fabricante de cigarros Souza Cruz onde atuava no setor de serviços gerais.
Em pleno carnaval de 1942, estando na Rua Chile, expôs-se a uma forte chuva adoecendo, motivo pelo qual resolveu retornar à terra natal pedindo dispensa da empresa onde já trabalhava a mais de um ano.
Aqui chegou em 8 de maio de 1942 bastante enfermo, tendo ficado acamado por quatro longos anos nos quais sofreu de paludismo e reumatismo. Em 1947, já curado passou a compor a orquestra da cidade, onde tocava pandeiro.
Em 1950 foi convidado para trabalhar na construção do açude de Pedra Riscada, povoado de Cansanção, sendo responsável pela folha de pagamento dos demais funcionários, tempo em que conheceu na praça da feira local uma moça bem jovem chamada Davina. Em poucos meses rumou para Itiúba onde estava sendo construído o açude estadual para exercer a mesma função de pontador. Ainda no mesmo ano participou por quatro meses da construção de outro açude em Lagoa do Mari, Monte Santo.
Terminado este período, já com trinta anos, voltou para Queimadas, reassumindo o pandeiro na Orquestra Jaden Recreio. No mesmo ano reencontrou Davina que aqui veio morar. Os dois passaram a dividir o mesmo teto, só depois oficializando a união.
O casal passou a residir na Rua Professora Lourdes Lantyer local de nascimento dos quatro filhos que tiveram: Marlúcio, Eliete, Joelma e Jorge França de Souza. Tempo em que trabalhava como cobrador do serviço de luz, que era produzida por gerador e fornecida pela Prefeitura Municipal. Em meados de 1953 foi nomeado por Nonato Marques, então Secretário da Agricultura, para executar os serviços de jardinagem da Sementeira.
Em 1954 envolveu-se na campanha política de Mário Santana que pleiteava a administração pública do município. Tendo o mesmo vencido as eleições ofertou a Joel um cargo na Prefeitura. No ano seguinte deixou a Sementeira passando a laborar na coletoria, imbuído de arrecadar o imposto de indulto de produção, função na qual se aposentou 32 anos depois.
Em 1963, em pleno mandato de Analdino Andrade como prefeito, Joel Amâncio ocupou pela primeira vez uma cadeira na câmara municipal dos vereadores. Foi reeleito ainda mais cinco vezes, sendo presidente da casa por três mandatos, chegando inclusive a ocupar a prefeitura em razão da ausência temporária dos responsáveis.
Neste longo período como representante do povo foi responsável pela aprovação de inúmeros importantes projetos em benefício da cidade, como por exemplo, calçamento de ruas, construção do posto de saúde (hoje hospital Edson Silva) e do prédio da Câmara (antes um açougue), além de obras na zona rural e povoados que compõe o território de Queimadas.
Segundo O Sr. Joel, a política praticada naquele tempo nada tem haver com a dos dias atuais. “A vida política não é difícil. Depende do comportamento de cada um. Tem pessoas que enganam muito. Naquela época os prefeitos trabalhavam. Não havia esta corrupção. Os políticos eram mais preocupados com o bem estar do município. Os vereadores eram atuantes, apesar de não remunerados”, diz o mesmo que entrou com uma ação na justiça buscando receber retroativamente pelos serviços prestados. “Hoje não existe nada. Ninguém faz nada”, conclui desiludido.
Queimadas, na visão do ex-vereador, era uma cidade muito boa, “tinha banda de música, o povo era mais unido, mais tudo do que hoje. No meu tempo a escola preparava, hoje só tem conversa, o ensino é ruim. Os jovens não conheciam droga, jogavam futebol, era da escola para o campo. Eram mais respeitadores, agora eles passam mangando dos mais velhos. As mulheres? Meu Deus do céu. Só iam para as festas, eventos familiares de qualidade, acompanhadas dos pais ou responsáveis. Os vestidos chegavam ao tornozelo. Nem os joelhos ficavam expostos. Os banhos de rio eram tomados de roupa. Elas estavam sempre bem arrumadas, impecáveis. Os rapazes namoravam de longe. Ao contrário da devassidão dos tempos modernos. Não usavam bermuda e chinelo. O usual era calça, paletó e chapéu diariamente”, conta.
Seu Joel lembra que havia famílias tradicionais em Queimadas, e cita alguns chefes: Humbelino Santana, Anfilófio Teixeira, João Lantyer e Elias Marques. Conta que as regras morais eram rígidas. “A moça que perdia a virgindade sem que fosse casada estava literalmente perdida. Era isolada, banida da sociedade. Não sendo aceitas nas reuniões sociais, festas, nem mesmo podendo freqüentar a escola”. Escola que por sinal segregava homens e mulheres. Havia apenas três estabelecimentos de ensino na cidade. Na Praça da Bandeira funcionava a escola da Profª Ediméia destinada às meninas. Enquanto que as outras duas, da profª Lourdes no Chalé e da Profª Ceci abrigava os meninos. “As meninas estão tornando-se mulheres antes do tempo. Perderam a inocência. O mundo atual é muito diferente de antigamente. Dormíamos com as janelas abertas, não se usava grade. A violência é maior do que na época de Lampião”.
Seu Joel viveu o tempo em que não existia geladeira, TV, nem rádio em Queimadas, usava-se pote. “As pessoas liam mais. O aspecto da cidade atualmente é melhor, a meu ver, sendo esta melhoria devido à iniciativa particular”. Queimadas na descrição do ex-vereador resumia-se à Praça da Bandeira, outra praça mais embaixo e um campo de futebol que deu lugar à feira livre. Existia ainda o Alto da Jacobina com poucas casas e só. “Hoje vê-se muitos prédios.” No entanto considera grave a atual falta de oportunidade e trabalho que acomete os jovens que sem ideal e limite sucumbem às drogas e à prostituição. “O pior é essa juventude sem trabalho, sem oportunidade. As meninas em sua maioria perdidas e o vício do Crack. Não consigo ver solução para isso. Essa juventude aceita o pior. A devassidão, a falta de ocupação, de limites e a desestruturação familiar os leva a isso. Os jovens não respeitam mais os pais. Eu nesta idade não conheço droga. Não se falava nesse assunto no meu tempo. Não existia isso por aqui”.
As lembranças do ancião refletem uma dinâmica diferente da conhecida. “Na rua da estação, ao final da Itapicuru, numa casa de esquina tinha um cabaré, local onde os rapazes iniciavam a vida sexual, conheciam a vida mundana através das conversas que tinham com as “Donas”, mulheres que em sua maioria tinham sido casadas e que separadas viam-se socialmente excluídas terminando no meretrício. Elas ficavam expostas na janela á espera de fregueses, eram proibidas de circular livremente pelas ruas e principalmente de freqüentar a estação, pois era costume das moças da sociedade, muito bem trajadas, para lá dirigirem-se todas as tardes a fim de ver os trens e seus passageiros.
Morador da Praça da Bandeira há mais de trinta anos, Sr. Joel no auge dos seus respeitáveis 90 anos, tendo sido um exemplo de homem público, cumpridor do seu dever e fiel às próprias convicções afirma ser um amante da vida e das mulheres. “Não tem coisa melhor do que viver. É assim, eu com essa idade estou aqui com você contando histórias. Isso é bom demais. Agora, tem coisas, principalmente na época de hoje, que são horríveis. Com a idade o sono desaparece, o apetite diminui, as pessoas se distanciam, nos ofendem mais, não são respeitosas. Mas não importa, porque já vivi muito e os que se comportam desta maneira não sabem do que sei e nem se chegam lá. A gente sente aquele mal estar, vai perdendo a auto-estima e fica desmotivado. As coisas mudam, perdemos o querer. Já tive medo de morrer, hoje bem pouco.” Parou por um momento, disparando em seguida: “Eu gostaria de saber se dói. Se não sentir dor é tranqüilo. Deve haver um lugar onde a alma permaneça, pois acredito que a morte é só física. A alma é eterna. Afinal nós estamos aqui conversando e isso requer mais do que a matéria. Não sei se podemos ver o que acontece aqui e não acredito em reencarnação. Acredito na existência de Deus. Olho para o céu e vendo uma estrela oro. Sempre me questiono porque não vivemos mais. A gente vem, gosta, depois desgosta e morre. Eu gosto muito, mas me sinto cansado.”
Com a construção da nova Câmara Municipal de Vereadores, inaugurada em junho deste ano, o salão nobre da mesma, até então nomeada Joel Amâncio de Souza mudou de nome passando a homenagear o Senhor Humberto Belo da Silva.

Fonte: http://www.queimadasfm.com.br/qfm/2011/04/07/joel-amancio-de-souza-2/

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