terça-feira, 31 de janeiro de 2012

QUEIMADAS - POEMA DE JOÃO JUSTINO DA FONSECA



QUEIMADAS

( João Justino da Fonseca)


Eis a cidade batizada outrora
Por Vila de Santônio das Queimadas:
Repara o vale, amigo, vê as quebradas
Vamos subir, vamos ao alto agora!

Aqui em cima, ao tôpo da colina
O Santo Antônio que abençoe a gente
Dos raios da manhã ao sol poente,
Habita a sua Igreja pequenina.

Ao lado, é a derradeira moradia
Que nos espera ao cabo da jornada
Ali, o esposo chora a bem amada
Ou o pai ao filho, e geme a ventania.

Lá embaixo está a cidade tagarela,
Onde a morena fresca como jambo,
Quer more no chalé, quer no mocambo
É perfumosa e pura, é meiga e bela.

Vê o Itapicuru lento descendo?
Se há trovoada sobe - é a inundação.
Já devorou a cidade u'a vez; então
Reconstruíram-na, mais alto sendo.
Porém a chuva falta é diferente:
O rio morre, e o leito a branca areia
Entrega ao calcinante sol. Alheia,
A dor se faz ao coração da gente.

Eis a Queimadas, um sertão abrupto
De sol tisnado, deste sol e fogo,
Que escalda tudo indiferente ao rogo
Do sertanejo requeimado e bruto.

Eis a Queimadas, a miséria, a fome,
O desamparo de um gigante povo.
Sertão simplório! - Este é o sertão que louvo
Pois quase morto, inda não há quem dome.

Sertão sem vida que o governo esquece
E só relembra quando há eleição.
Sertão sem força e luz, sem água e pão,
Sem hospitais, ginásios...Sem a messe
De pompas, de fulgores do " Alvorada"
Ou "Guanabara", de um " Aclamação".
Sertão que foge, busca roldão
Outras paragens, vida mais folgada.

Eis a Queimadas, um sertão trigueiro,
De areia quente, barro seco e pedra!
Terra onde apenas verdejante medra
Mandacaru, quixaba ou juazeiro.
Gleba fecunda mas sem água, incerto
Luta e Sertão, desesperado vibra!
Lavra o sisal...Por Deus viceja a fibra
No solo adusto do inferno deserto.

Eis a Queimadas, ficus rua a rua
Agasalhando da nudez a urbe.
Eis a Queimadas, o "Recreio Clube"
Deleita e anima a mocidade sua.

Eis a Queimadas, quando a chuva pinga,
O lavrador corre apressado ao solo,
Fofa-o a enxada, planta no seu colo
Milho e feijão, que após morrem a míngua
da chuva que se vai, não reaparece.
Chove depois que a safra está perdida.
E planta-se outra vez, na ingente lida,
Na esperança que à força de uma prece.
Levada a Deus por corações ingênuos,
Retorne a chuva e ponha tudo a salvo.

- Deus que comanda a vida lá do alto
E bonançoso céu, dias amenos
Mande-te ainda, Pátria de meus filhos!
Mas ah que Deus deu liberdade á terra.
E liberdade é luta! E a luta encerra
O fracasso ou a vitória, prantoou brilhos!

E fracassaste tu, Sertão , na luta
De encontro à mesquinhez da natureza
Governo e lei - trancados na dureza
De corações sem fé - ninguém te escuta!

Eis a Queimadas, taboleiros planos,
Verdes, floridos, quando a chuva desce.
Baja o feijão, o milho reverdece!
Essa queimadas, não se vê, faz anos!

Eis a Queimadas, um sertão abrupto,
Solo fecundo que eu adoro harto!
Quer rico ou pobre, quer faminto ou farto,
Quer verde ou seco, cultivado ou bruto!

II

- Era uma noite de luar sereno
Resplandecendo sobum céu azul.
Nesta Queimadas pelo sol tisnada,
Embarca Flora com seu destino ao sul.

Leva no peito uma saudade imensa,
Um gosto amargo dissabor de morte
Negra desgraça o coração lhe oprime,
E sente fome e pensa em sua sorte.


Fonte: ( Santo Antônio das Queimadas ( Nonato Marques). pag.197/198/199)

Nenhum comentário:

Postar um comentário