terça-feira, 31 de janeiro de 2012

LAVAGEM DA IGREJA

                               Foto: baianas no cortejo cultural início da década de 80.

A LAVAGEM DA IGREJA

A tradicional festa de Queimadas, acontece sempre no último domingo do mês de maio, dando início às festividades das trezenas de Santo Antônio das Queimadas.
O nome da festa nos últimos anos sofreu modificação, por determinação dos representantes da Igreja católica, que pediram para retirar "Igreja de Santo Antônio", do nome, ficando oficialmente denominada "Lavagem de Queimadas", justificando que a festa perdeu completamente sua característica religiosa, transformando-se num evento eminentemente profano. Além da modificação no nome, ficou proibida também a tradicional lavagem do adro da igreja e a entrada de trios elétricos no perímetro da festa onde ficam as barracas.
Os saudosos queimadenses, nostálgicos, relembram da Lavagem da Igreja em outros tempos e falam que a festa perdeu muito de sua característica cultural, apesar dos esforços realizados pelo poder público nos últimos anos no resgate do cortejo cultural, que estava em vias de desaparecer, em virtude da modernização da festa através de blocos e trios elétricos, ganhando uma imagem micaretesca.
Segundo contam, a Lavagem da Igreja teve início quando um grupo de senhoras, tendo à frente a saudosa Sra. Sinforosa Lírio ( antiga parteira de Queimadas), se deslocavam até o Templo de Santo Antonio num movimento religioso que foi crescendo no decorrer dos tempos.
Logo abaixo, um relato do jornalista Louriel Bezerra, em 1983, sobre a festa:

" A animação é total, abrangente. Contudo, um detalhe: o cemitério anexo parece não se dar conta dessa movimentação. O respeito pelos que lá descansam é sagrado. E todos sabem disso.
A participação do trio elétrico e do povo dançando emprestam a esta festa um colorido todo especiai. Assim, acrescente-se o desfile de trajes típicos da Bahia pelos colegiais. Tudo dentro de um visual belo e característico de nossa terra. A festa é mística. Neste vai e vem ela atinge seu ponto culminante. Os devotos em razão da proibição do clero, numa repetição ritualística da festa da Lavagem da Igreja do Senhor do Bonfim da Bahia, lançam por fora das grades do adro do Templo. água perfumada e ramos de flores, usados como vassouras, simbolizando a lavagem propriamente dita. A festa se prolonga até o fim do dia, que por sua vez, dá por aberto o ciclo das trezenas de Santo Antônio. No desfecho das impressões causadas e deixadas, uma confirmação: é sem dúvida alguma, a maior festa religiosa da região".

A seguir, uma reportagem do site Calila Notícia, sobre a 41º Lavagem de Queimadas:

"Terminou nas primeiras horas desta segunda-feira (30), os shows das bandas que se apresentam durante os três dias de festa da 41ª Lavagem de Queimadas. Várias bandas se apresentaram no palco armado no começo da ladeira de acesso a Igreja no Alto de Santo Antônio e no domingo (29), último dia, Seu Maxixe, fechou com brilhantismo o evento promovido pela prefeitura.
Por volta das 11h de domingo, aconteceu o cortejo com apresentações de diversas alas que conforme declaração do prefeito Sérgio Brandão ao CN, um dos seus objetivos era resgatar a parte cultural do evento.
A ala das crianças deu um brilhantismo especial na manhã de sol. Após alguns anos, os cavalheiros voltaram às ruas misturados com as baianas, uma marca forte da lavagem. Segundo os historiadores, foram elas que iniciaram os festejos que visava lavar a Igreja para os 13 dias de atos litúrgicos que prepara os fiéis para a festa de Santo Antônio.



                               Foto: Harmonia do Samba no Bloco ¿Será Que é Hoje? em 2011.

O desfile tem sido sempre o principal atrativo das manhãs do domingo dia maior da festa, que dá oportunidade as crianças e idodos a participarem.
Trazendo em seu repertório o melhor do pagode baiano, o Harmonia do Samba, liderado pelo vocalista de Xanndy fez o Bloco ¿Será Que é Hoje? sacudir com suas melodias, sucessos como “A Gente Sacode” “Comando”, “Selo de Qualidade” e “Rebola”. Xanddy esbanjou simpatia para todos e o expressivo público feminino foi à loucura com as famosas reboladinhas do carismático artista. O cantor entrou em cena por volta das 18h30 e no trio elétrico Twister, o primeiro a desfilar na avenida e um camarote andante. Segundo os organizadores, foram vendidos mais de 2.500 abadás e esgotado os ingressos de acesso ao camarote, novidade na festa da lavagem.

Fontes: (Nonato Marques. Santo Antônio das Queimadas. pag.162)

             http://www.calilanoticias.com/2011/05/saiba-tudo-sobre-a-41%C2%AA-lavagem-de-queimadas-3.html



 Fotografia da chegada do cortejo cultural ao adro da Igreja de Santo Antônio, no ano de 1995.

 UM PRESENTE DO PASSADO
(Jesner A. Barbosa)


Reza a lenda que a primeira lavagem da Igreja de Santo Antônio de Queimadas foi realizada no final dos anos 40, há mais de seis décadas, portanto, tendo como principal personagem desse acontecimento histórico a então jovem senhora Sinforosa Lírio, célebre parteira e ex-vereadora do município, a nossa conhecida “Mãe Sinforosa”, auxiliada por outras vinte e cinco parturientes.
O movimento ganhou força e a cena interativa tornou-se habitual. Com as latas d’água equilibradas em rodilhas sobre as cabeças, trazidas do canal do rio Itapicuru próximo dali, as mulheres com entusiasmo lavavam o adro da igreja para, em seguida, dar início a Trezena de Santo Antônio – uma série de orações e práticas litúrgicas que se seguiam durante os 13 dias antecedentes ao dia do santo para obtenção de alguma graça divina.
Apoiado pelos párocos da igreja, o ritual religioso expandiu-se no decorrer dos anos evoluindo para as manifestações populares festivas organizadas por uma comissão composta de pessoas de destaque na sociedade queimadense para promover as feiras paroquiais, denominadas quermesses, animadas pela alegria das fanfarras e pelo deslumbramento dos parques de diversão, ao tempo em que rezavam as trezenas marcadas por ruidoso foguetório.
A festa culminava na noite do dia 13 de junho com uma procissão iluminada por velas acesas protegidas em cones de papel celofane levadas pelos fiéis, seguindo em cortejo pelas principais ruas da cidade acompanhado pelos componentes da Filarmônica Recreio Queimadense que, ao final, dirigia-se à colina sagrada conduzindo o andor do santo até o interior da igreja para receber a bênção do Santíssimo Sacramento.
A repetição desta manifestação popular inspirou o então Prefeito Abelardo Borges Simões de Oliveira que decidiu urbanizar a avenida que dá acesso ao templo cristão, e ao inaugurá-la no início dos anos 70, oficializou o já tradicional desfile da lavagem da Igreja de Santo Antonio nos moldes em que conhecemos hoje, fixando como data da festividade aquela correspondente ao último domingo do mês de maio, afastando, desse modo, a coincidência com a data comemorativa do santo padroeiro. Inovou ao introduzir os desfiles de carroças enfeitadas formando alas com temas folclóricos caracterizados por pessoas fantasiadas a caráter desfilando em cortejo pela cidade até o alto da colina sagrada. Ao final das trezenas a sociedade queimadense e demais convidados comemoravam o dia do santo padroeiro com uma bonita e concorrida festa de gala no Recreio Clube.
Desde então, retornamos à cidade para rever velhos amigos e parentes, assistir ao desfile e nos reunir nas imediações da Igreja de Santo Antonio a nos regozijar nesta data festiva que anualmente nos propicia este encontro de várias gerações de queimadenses com alegria e contentamento.
Nos primórdios, concebido como evento de cunho eminentemente religioso em congraçamento de fé, o cortejo sempre despertou nos sacerdotes certa resistência aos apelos populares festivos que aos poucos transformavam a festa. E a discórdia tem se agravado paulatinamente com a adesão de blocos carnavalescos animados por trios elétricos e a promoção de shows das bandas de forró estilizado, descaracterizando totalmente a festa religiosa na sua concepção original.
O fato é que, embora essa fusão de valores antagônicos desagrade aos religiosos, o povo tem demonstrado preferência pelo lado mundano da celebração, pois, ao que parece, deixa-se seduzir mais facilmente pelos cantos e ritmos que fazem a alegria da festa, mas que têm contribuído decisivamente para o crescimento cada vez maior desse evento e, por via de conseqüência, incentivando ainda mais os seus promotores e investidores.
É indiscutível que a religião faz parte da cultura de um povo e influencia a sua própria tradição. A Bahia é um forte exemplo dessa evidência, pois muitas das festas católicas transcendem a esfera religiosa para dar lugar às manifestações populares, ditas profanas, que se tornam naturalmente tradicionais não apenas pelo costume adquirido, mas, sobretudo, pela transmissão de hábitos culturais de geração em geração.
Neste diapasão, a cultura e a tradição com suas propensões para ritualizar e englobar conhecimentos constituem os mais importantes pilares de uma sociedade, configurando a sua própria essência. Elas não se confundem, mas guardam relativa dependência, já que a tradição faz parte da cultura, porém esta subsiste sem a tradição. Isso significa dizer que a tradição não sobrevive distanciada da cultura de um povo, sobretudo a religiosa.
A festa consagrada à celebração de Santo Antonio é vital para a comunidade religiosa de nossa terra, bem como é igualmente importante para as pessoas em geral que desejam participar dos folguedos e ambas as manifestações podem conviver pacificamente. É uma questão de organização e bom senso.
Trata-se de uma data memorável em que presenciamos continuamente a afluência de milhares de pessoas oriundas dos diversos municípios circunvizinhos e alhures para celebrar conosco a nossa devoção cristã, ao tempo em que nos alegramos nos reencontros de familiares e amigos distantes: a rezar, a sorrir e a cantar.
Infelizmente, o último dia 30 de maio – data em que se pretendia comemorar oficialmente o quadragésimo aniversário oficial do desfile da lavagem da igreja do nosso santo padroeiro, sob os auspícios do governo municipal – passou em branco em meio à turbulência jurídica que varreu os mandatários políticos. Naquela oportunidade única em que comemoraríamos solenemente data tão significativa, acontecimentos supervenientes precipitaram reações adversas.
A Câmara teria deliberado sobre um projeto de resolução de autoria do vereador Nilton Barbosa autorizando a fixação de uma placa alusiva ao fato histórico e ao seu organizador, mas ao invés de vivenciarmos um dia glorioso e festivo com a materialização de um momento mágico e revelador de nossas tradições, através de uma justa homenagem ao idealizador do evento popular mais representativo de nossa terra, presenciamos o abandono e o esquecimento.
Um fato deveras lastimável! Não pelo mandamus moralizador da justiça baiana que apeou do poder os maus gestores públicos, mas pela coincidência das datas que provocou a exoneração da cúpula governista e abortou a programação planejada.
Ao contrário da política que impera nos dias de hoje em que se sobrepõem os projetos pessoais e familiares, Abelardo Borges foi um político da era romântica dos homens públicos escorreitos e bem-intencionados; comprometido com as questões sociais priorizava as ações que beneficiavam a população, como a criação de empregos através de frentes de trabalho para construção de pequenos açudes e “aguadas” e a edificação de escolas nas áreas rurais, mesmo limitado aos orçamentos minguados de sua época. Era um homem honesto, desambicioso e sonhador que à frente da prefeitura deixou uma marca indelével em sua breve gestão ao oficializar um evento de forte apelo popular – uma realização que o tempo mostrou ser de grande valia e alcance social.
E isso nos leva a uma reflexão: alguns homens e mulheres são importantes pela ostentação de riquezas, pelos cargos que ocupam ou pela tradição familiar, mas, há os que se destacam pela generosidade que se traduz nas ações do cotidiano, da expressão de solidariedade e do amor ao próximo; outros, porém, tornam-se importantes por suas atitudes visionárias que embora passem despercebidas da maioria se revelam na perpetuidade do tempo e provocam atos de reconhecimento dos seus pares no futuro, como os que agora testemunhamos.
Como queimadense e sobrinho do protagonista mais destacado deste acontecimento, sinto orgulho do seu feito, e como cidadão me perfilo em sua homenagem como reconhecimento ao sucesso desta festividade sócio-religiosa, hoje inserida definitivamente no calendário dos tradicionais festejos juninos de nossa região.
Abelardo Borges é digno e merecedor de uma honraria maior, à altura do seu empreendedorismo em prol da preservação da cultura popular, e uma forma de valorizar o seu papel é perenizar o seu nome batizando uma rua desta cidade, de preferência em logradouro próximo ao local do evento, ou designando-o oficialmente ao circuito do cortejo público, além da placa comemorativa, como reconhecimento da população. Isso decerto trará algum conforto aos familiares e descendentes, além de servir de referência histórica exemplar às novas gerações.
Pensando a cultura como a representação das características e peculiaridades de um povo que envolve crenças, costumes e demais hábitos adquiridos ao longo do tempo, e a tradição como um conjunto desses atributos que são seguidos e partilhados sucessivamente por várias gerações, conclamo as atuais autoridades municipais e eclesiásticas para que mantenham o firme propósito
de cumprir a tradição da Festa de Santo Antonio em reverência à memória de nossa gente, identidade e preservação da nossa história para gáudio e afirmação de fé das futuras gerações.

Fonte: http://queimadasbahia.blogspot.com/search/label/Lavagem%20da%20Igreja%20Abelardo%20Borges%20Festa%20Santo%20Antonio


 Baianas cortejo cultural da Lavagem da Igreja. Década de 80.


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